domingo, 3 de abril de 2011

Homenagem ao passado de orgulho




Tatiana Furtado,para O Globo.


Ao entrarem no campo
de São Januário,
hoje, às 16h, Vasco
e Bangu farão o
180º
confronto
entre
os dois clubes.
Mas por trás de
mais um jogo de futebol,
o de hoje se
reveste de simbolismo e história
de pioneirismo de ambos
contra o racismo no esporte.
De um lado, o time da casa estreia
o terceiro uniforme, em
homenagem aos Camisas Negras
dos anos 20, que conquistaram
o primeiro título carioca
de um clube que tinha em seu
elenco negros e mulatos. Do
outro, está justamente o primeiro
do Rio a escalar um negro,
o meia Francisco Carregal,
entre seus titulares antes mesmo
da criação oficial do Estadual,
em 1905.
— São dois clubes com
grandes histórias na questão
racial. O Bangu foi o primeiro a
aceitar jogadores negros, o
Francisco Carregal, o Manuel
Maia, o Luís Antônio da Guia,
irmão do Domingos da Guia.
Entre os grandes do Rio, o Vasco
tem uma história diferente
porque promoveu a inclusão
social na década de 20 — afirmou
o diretor de patrimônio
do Vasco, João Ernesto da
Costa Ferreira, desfazendo
qualquer briga com o Bangu
pelo pioneirismo no caso.
Com os dizeres “Respeito e
Igualdade” no peito, a camisa,
toda preta e sem faixa diagonal,
rememora uma época do
clube fundado por portugueses
que abriu as portas aos negros
e pobres. Num esporte
até então amador e elitista, a
ascensão do Vasco no Carioca,
saído da Segunda Divisão em
1922 e campeão em 1923, incomodou
os dirigentes dos outros
clubes e começou a despertar
a paixão no povo:
— O Vasco foi campeão de
forma avassaladora, só perdeu
um jogo. No ano seguinte, os
grandes do Rio criaram outra
liga no lugar da liga existente.
Convidaram o Vasco, mas uma
das condições era que afastasse
do seu plantel 12 jogadores
de ocupações duvidosas, consideradas
inferiores, na maioria
negros e mulatos. O então
presidente José Augusto Prestes
não aceitou e enviou uma
carta recusando o convite. A
carta é um verdadeiro libelo
contra a discriminação racial e
social. É um troféu, tanto que
está exposta na sala de troféus
— disse Oliveira, lembrando
que o Vasco foi campeão em
1924 por outra liga.
Foi algo que já havia acontecido
com o Bangu alguns anos
antes. O clube, que aceitou os
operários Francisco Carregal,
em 1905, e Manuel Maia, em
1906, os primeiros negros de
que se têm registro no futebol
carioca, também recebeu o pedido
da liga para retirá-los do
elenco. Pedido negado, que
afastou o time do Carioca de
1907 e 1908.
— Na verdade, não sabia de
todo este passado do Bangu.
Sempre soube das dificuldades
dos negros, como a história
do jogador do Fluminense,
que teve que passar pó de arroz
para ficar branco e jogar.
No Bangu, sempre houve muito
respeito. Também me sinto
homenageado com essa iniciativa
do Vasco — disse o técnico
do Bangu, Marcão, que começou
e encerrou a carreira
no clube.
No jogo do respeito, a única
disputa vai ser na bola pela vaga
nas semifinais da Taça Rio,
que ambos tentam alcançar. O
lugar na história já lhes pertencem.



Bangu apoiou represálias contra o Vasco em 1923.

Do Lancenet

O duelo Vasco e Bangu, tem uma importância histórica para o futebol nacional que a equipe de São Januário irá resgatar com uma justa homenagem. O time cruz-maltino entrará em campo com o novo terceiro uniforme, todo preto, em alusão à equipe de 1923, primeira a se sagrar campeã carioca com negros em seu elenco. No entanto, o primeiro clube no Rio a aceitar afro-descendentes em seu plantel foi o alvirrubro da Zona Oeste.

Os pioneirismo de Vasco e Bangu permitiu com que, por exemplo, os ícones das duas equipes sejam hoje dois negros, como o zagueiro Dedé e Marcão, hoje técnico banguense.

- É motivo de orgulho ter sido revelado pelo clube que abriu as portas para os negros - disse Marcão, que começou no alvirrubro.

No início do século, futebol era considerado um esporte de elite. Por isso, os jogadores de futebol da época eram membros e descendentes da alta hierarquia carioca. Mas, em 14 de maio de 1905, em um amistoso contra o Fluminense, o Bangu colocou em campo um time formado por estrangeiros da Itália, Inglaterra e Portugal. O único brasileiro era Francisco Carregal, filho de um português e uma brasileira negra. Este foi o primeiro registro de um jogador negro em uma partida de futebol no Rio.

De acordo com relatos da época, Francisco era muito vaidoso e procurava se vestir de maneira impecável, justamente para minimizar o preconceito racial, que era grande no meio futebolístico. O pioneirismo do Bangu abriu as portas para outros negros nos gramados. No entanto, eles ainda eram minoria e defendiam clubes menores.

As equipes com afro-descendentes não ameaçavam a hegemonia dos principais clubes da época (Flamengo, Fluminense e Botafogo). Isso só foi acontecer em 1923, quando um time recém-promovido da Segunda Divisão fez uma campanha impecável no Carioca. Com camisas negras e maioria dos atletas de origem mestiça, o Vasco foi o primeiro campeão que acabou com a então superioridade branca no futebol.

Indignados com a vitória dos vascaínos, Fla, Flu, Bota e América tentaram eliminar os negros do futebol, alegando que estes, por serem humildes, se sustentavam do esporte e seriam profissionais. Com medo de represálias, o Bangu se adequou à determinação. Já o Vasco lutou por seus atletas e não aceitou expulsar os afro-descendentes do elenco. Com isso, ficou fora do Carioca de 1924.

O ato cruz-maltino foi reconhecido em 1925. Vendo que o Vasco ganhou grande popularidade por conta de sua luta contra o preconceito, os grandes acabaram com a determinação de excluir os negros e a equipe vascaína foi reintegrada ao Carioca.

Nenhum comentário:

Postar um comentário